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O principio da dadiva no networking

Mario Persona conversa consigo mesmo sobre um assunto bem presente: a dádiva. Esse favor imerecido que nada teimosamente contra a corrente do instinto humano é abordado da perspectiva do networking e do relacionamento com o cliente.


P. Fala-se muito em gerar relacionamentos, não só com clientes mas com qualquer pessoa. Como criar um relacionamento?

Um relacionamento você cria com base no princípio da dádiva. Quando você dá algo a alguém, ou faz algo por essa pessoa, você dá o primeiro passo que promove um relacionamento. Mas essa dádiva não pode ser condicional.

P. A dádiva não gera algum tipo de angústia em quem recebe?

Em um certo sentido sim. A dádiva cria uma responsabilidade em quem recebe. É claro que a primeira coisa que a dádiva gera é gratidão, que nós expressamos com a palavra "obrigado", que é uma espécie de vínculo, de amarra, que se traduz como uma obrigação de reciprocidade.

P. Quer dizer então que essa história de networking, de criar relacionamentos apenas pela troca de cartões não funciona? Um cartão não passa de um papel sem valor.

Bem, a troca de cartões pode levar ao princípio da dádiva, mas veja que quando falamos de valor, isso não significa necessariamente preço. Uma coisa pode não ter custo algum, como um cartão, mas ter um valor tão grande que a torna sem preço, impagável. Um cartão recebido, por exemplo, de uma pessoa influente pode ser interpretado como uma dádiva por abrir portas. Geralmente as dádivas mais caras são as que não têm preço.

P. E o que pode agregar valor à dádiva?

A necessidade de quem recebe, seu interesse por aquilo, as circunstâncias, o momento... várias coisas podem ajudar a criar valor. É interessante, mas parece que o valor das melhores dádivas está na aura emocional que a envolve. Um papel de bala, por exemplo, é lixo, mas se tiver sido dado pelo namorado ele vale ouro. A garota vai guardá-lo para sempre.

P. Então a essência do networking e do marketing de relacionamento não está na troca de cartões?

Isso, a mera troca de cartões está cercada de interesses de ganho, e carrega uma mensagem do tipo "compre de mim", "estou de olho no seu dinheiro", "pague e eu farei algo por você". O verdadeiro relacionamento começa com a iniciativa de dar de forma desinteressada, não de receber.

P. Qual o papel da emoção nesse contexto?

O clima emocional é muito importante. O momento, o cenário, o estado emocional, tudo isso funciona como um adesivo na memória do receptor da dádiva. Se você quiser criar um relacionamento, seja ele afetivo ou de negócios, é preciso pensar como um diretor de cinema, que usa som, imagem e comunicação para causar uma impressão permanente no espectador.

A dádiva não termina no ato de dar. É necessário você obter o feedback disso, medir as reações, os sentimentos. Se você precisou botar sua empatia para trabalhar na hora de descobrir o que poderia ser interpretado como valor pelo outro, antes mesmo de oferecer sua dádiva, agora é hora de usar de empatia para medir os resultados. Tentar sentir o que o outro sentiu.

P. Que se resume em gratidão e desejo de reciprocidade, ou tem mais alguma coisa?

Tem sim, e é aí que a dádiva fica ainda mais interessante; é aí que começa o verdadeiro networking. O ato de dar ou fazer algo por alguém vai contra os nossos instintos de sobrevivência. Vai contra a lei do mais forte que subjuga o mais fraco tirando dele, não dando. Só que quando você percebe que pessoas generosas vivem mais de bem com a vida, e pessoas mesquinhas não, você quer descobrir que existe por trás da generosidade. Quando você é o beneficiário de uma dádiva, pode acabar contaminado pelo princípio da dádiva; vai querer descobrir o que é moveu a outra pessoa e acabará também fazendo algo por alguém para sentir o mesmo.

P. Então a dádiva pode gerar no benfeitor uma sensação de superioridade, de controle e poder sobre o beneficiado.

Sim, porque o rio sempre corre de cima para baixo. O próprio desejo de ajudar alguém pode brotar de uma necessidade de vanglória, de poder se gabar de ter ajudado essa ou aquela pessoa. Mas vamos nos concentrar nos resultados, e não nos motivos que levam a eles. É importante entender que a dádiva pode gerar uma reação em cadeia e criar na pessoa que recebe não apenas sentimento de dívida e reciprocidade, mas também de responsabilidade de fazer o mesmo por uma terceira pessoa.

P. Mas até aqui me parece mais uma cadeia linear de dádivas. Quando é que isso começa a funcionar como um networking, como uma rede de relacionamentos, e não de cima para baixo?

Quando aquele que é, digamos, o tataraneto do processo que você iniciou decide fazer de você o beneficiário de uma dádiva. Fechou o círculo. Agora você, que iniciou o processo da dádiva, passou a ser devedor de alguém, no sentido de sentir gratidão, não de ter de pagar, e se sentirá estimulado a ser novamente benfeitor de alguém, iniciando um novo ciclo, talvez em nova direção.

P. Em outras palavras eu fui vítima do meu próprio feitiço.

O verdadeiro networking funciona assim, sempre com alguém dando e alguém recebendo. Mas nem todos mantêm a corrente, e isso geralmente acontece naqueles elos que não entendem que a dádiva funciona como um bumerangue, é moeda circulante. É por isso que em tempos de crise os governos estimulam o crédito e pedem que as pessoas comprem. O represamento leva à estagnação.

P. Dê um exemplo prático do princípio da dádiva entre um fornecedor e um cliente.

Ok, digamos que você ouviu tudo isso e decidiu ligar hoje mesmo para uma empresa de brindes e encomendar uma porção de coisas com sua marca estampada nelas. Amanhã você aparece no cliente e despeja uma tonelada de brindes na mesa dele. Pode até funcionar, mas não é disso que estou falando. O princípio da dádiva não inclui brindes.

P. Não?! Mas não é dado?

Não é a mesma coisa; falta ao brinde aquele vínculo emocional que a verdadeira dádiva tem. Uma dádiva nem precisa ser algo tangível. Pode ser um favor ou um simples gesto. Pode ser conseguir a figurinha que faltava no álbum do filho de seu cliente. O brinde tem uma conotação comercial, tem uma marca colada nele, dá a impressão que você quer que seu cliente faça propaganda para você. A propriedade do brinde nunca é transferida totalmente para o cliente, porque sua marca continua lá.

P. Mas isso não faz ele se lembrar de mim na hora de comprar?

Pode fazer, mas não tem o poder da dádiva. Imagine que eu sou seu cliente e, ao invés de me dar uma caneta com a sua marca, você traz de suas férias em Recife um daqueles lápis baratos vendidos em feiras de artesanato, com a palavra "Recife" entalhada na madeira. Aí você me entrega o lápis e diz: "Estive em Recife e me lembrei de você".

O lápis não tem o seu nome, não tem a sua marca, não traz qualquer indicação de origem, mas eu nunca mais vou me esquecer de quem deu. Você não tinha obrigação de pensar em mim em suas férias e, se fez isso, fico constrangido a dar preferência a você na hora de decidir fechar um negócio. Fica a sensação de que eu lhe devo uma, e mesmo que eu faça algo em troca, um gesto assim cria uma dívida impossível de ser totalmente quitada. Se você me pedir qualquer coisa eu me sentirei constrangido a atender o seu pedido.

P. Até comprar rifa?

Até comprar rifa e rir de suas piadas.



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O Espírito da Dádiva - Jacques T. Godbout

Nem só o interesse, o desejo de poder e a coerção pública regem as relações entre as pessoas. Opondo-se à visão utilitarista dominante nas interpretações da história e do jogo social, este livro mostra que o espírito da dádiva não se manifesta só em ocasiões como o Natal, ou em brechas da moderna sociedade liberal, mas o tempo todo e em toda a parte: nas organizações, no mercado de arte, nas reuniões dos Alcóolicos Anônimos, nas doações de sangue e de órgãos.

Na perspectiva deste livro, a dádiva, assim como o mercado e o Estado, forma um sistema de circulação de bens e prestação de serviços que serve, antes de mais nada, para criar vínculos sociais, e a sedução da dádiva tem tanto poder quanto a do ganho - portanto, é tão importante elucidar suas regras quanto conhecer as leis do mercado ou da burocracia para compreender a sociedade moderna.

Nesta obra pluridisciplinar, a linguagem utilizada é clara e evita o ´calão´ dos especialistas. Alimentando com inquéritos sobre o "terreno originais", e por uma análise crítica aprofundada da literatura existente este livro, apaixonará o grande público que espera conhecer os mistérios da dádiva, e os investigadores em ciências sociais que, aqui, descobrirão estimulantes perspectivas.

Editora: Instituto Piaget
Autor: JACQUES T. GODBOUT
ISBN: 9728329466
Origem: Importado
Ano: 1997
Edição: 1
Número de páginas: 335
Acabamento: Brochura
Formato: Médio


E a gorjeta, doutor?

Youtube, widescreen e pensamento bi-hemisferico

Tá todo mundo atrás de uma solução milagrosa para a crise. Quer uma idéia? Veja o Youtube. Reparou que ele esticou? Virou widescreen.



Se já era preciso ser criativo para encher de tutano aquela telinha 4:3 copiada da TV antiga, imagine encher a linguiça 16:9. Para enfrentar a crise o jeito é pensar widescreen, igual ao Youtube, colocar os dois hemisférios para trabalhar.

Já viu como todo mundo está cortando tudo? Custos, pessoal, material, cafezinho. Ok, não ia dar mesmo para continuar com toda aquela gordura. Mas onde você acha que isso vai chegar? Quando todos cortam custos, todos ficam de custos cortados. Iguais, idênticos, sem qualquer diferencial competitivo. Sim, isso já é uma big mudança, mas é uma mudança commodity, compulsória e global, que não diferencia ninguém.

A mudança que faz a diferença não é a imposta pelas circunstâncias, mas a desencadeada pela criatividade e inovação. Criatividade é a geração de novas idéias, e inovação é colocá-las em prática. O resultado é a mudança que tira você da tela estreita da mesmice e o coloca numa faixa do espectro de idéias que ninguém ainda ocupou.

Para isso você vai precisar usar o resto da tela de seu cérebro, despertar sua lateral direita, entorpecida, e pensar de modo bi hemisférico. Mono hemisféricos nós já somos, treinados que fomos por escolas que mataram a criatividade e nos transformaram em maquininhas de pensamento lógico, racional e analítico.

É na escola que a professora interrompe o vôo da nave espacial que nossa mão faz dar piruetas no ar, para explicar que aquilo não passa de uma caneta. A escola joga uma pá de cal cartesiano na fantasia colorida da infância, e somos catapultados sem piedade para o mundo cinzento dos adultos.

Na escola quem acerta na prova se dá bem. Na vida, quem erra, aprende e tenta mil vezes se dá melhor. A menos que você comece a desenvolver alguma atividade criativa nas profundezas do hemisfério direito de seu cérebro, seu destino é virar mais um Smith do Matrix, aquele com óculos de camelô e gravata do avô. São poucos os neolíderes da verdadeira revolução, a criativa.

O líder da mudança criativa é otimista, vive em busca de oportunidades. É também tolerante para com o erro porque aprende com ele. É bem humorado porque se diverte fazendo o que faz. É curioso, indagador, e não tem medo de dizer que não sabe e quer aprender. É apaixonado e se entusiasma com a facilidade de uma criança.

Esse líder adora procurar sarna pra se coçar, enfiar o nariz onde não foi chamado e grudar num problema que ninguém quis resolver. É contagiante. Você não consegue passar perto dele sem ser abordado, agarrado e persuadido pela paixão com que ele tenta vender suas idéias.

Mas você não será criativo se continuar pensando do jeito mono hemisférico que treinou na escola. E nem se cair no equívoco dessa forma de trabalho em equipe que encontra em algumas empresas.

Nas empresas quadradinhas, trabalho em equipe é tudo aquilo que visa chegar a um resultado de consenso. Tá bom, você conhece alguma obra de arte pintada por uma comissão? Arte verdadeira é aquela que a genialidade de um artista pintou e foi reconhecida como tal por um grupo de pessoas. A equipe.

Dê a lista de autores de "Senhor dos Anéis", toque uma sinfonia composta pela equipe da qual Beethoven fazia parte, ou sugira ao Hamilton tentar ser campeão outra vez levando no cockpit o pessoal do box. Entendeu agora que equipe é uma soma de talentos individuais e não a sua diluição? Que equipe é um terreno que produz ouro, não amálgama?

Infelizmente muitos líderes não vêem assim. Eles estão mais para carpinteiros que enxergam seus subordinados como pregos numa tábua. É só perceber uma cabeça saliente e ele martela até ficarem todas iguais.



Posfácio: Tive um trabalho doido para colocar meus vídeos lado a lado e, principalmente, para sincronizar as falas, pois não uso nada sofisticado: Windows Movie Maker (para edição de vídeos) e Audacity (para edição de áudio) e um pouquinho de criatividade. Mas criativo mesmo é esse cara, mesmo que as vozes não sejam dele (é dublagem):



Do autor do vídeo: All the 4 beautiful voices belong to the men from Moosebutter. They are a professional a cappella comedy group from Utah, and were kind enough to assist me in the making of this video. Check them out and hear more hilariously awesome songs at http://www.moosebutter.com/

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Fora de Série : Outliers - Malcolm Gladwell

O que torna algumas pessoas capazes de atingir um sucesso tão extraordinário e peculiar a ponto de serem chamadas de "fora de série"?

Costumamos acreditar que trajetórias excepcionais, como a dos gênios que revolucionam o mundo dos negócios, das artes, das ciências e dos esportes, devem-se unicamente ao talento. Mas neste livro você verá que o universo das personalidades brilhantes esconde uma lógica muito mais fascinante e complexa do que aparenta. Baseando-se na história de celebridades como Bill Gates, os Beatles e Mozart, Malcolm Gladwell mostra que ninguém "se faz sozinho". Todos os que se destacam por uma atuação fenomenal são, invariavelmente, pessoas que se beneficiaram de oportunidades incríveis, vantagens ocultas e heranças culturais. Tiveram a chance de aprender, trabalhar duro e interagir com o mundo de uma forma singular. Esses são os indivíduos fora de série - os outliers.

Para Gladwell, mais importante do que entender como são essas pessoas é saber qual é sua cultura, a época em que nasceram, quem são seus amigos, sua família e o local de origem de seus antepassados, pois tudo isso exerce um impacto fundamental no padrão de qualidade das realizações humanas. E ele menciona a história de sua própria família como exemplo. Além disso, para se alcançar o nível de excelência em qualquer atividade são necessárias nada menos do que 10 mil horas de prática - o equivalente a três horas por dia (ou 20 horas por semana) de treinamento durante 10 anos. Aqui você saberá também de que maneira os legados culturais explicam questões interessantes, como o domínio que os asiáticos têm da matemática e o fato de o número de acidentes aéreos ser mais alto nos países onde as pessoas se encontram a uma distância muito grande do poder.

Editora: Sextante
Autor: MALCOLM GLADWELL
ISBN: 9788575424483
Origem: Nacional
Ano: 2008
Edição: 1
Número de páginas: 288
Acabamento: Brochura
Formato: Médio

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