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Com a lingua nos dentes

O êxodo de profissionais que saem do Brasil para viver e trabalhar no exterior não é coisa nova. Começou no regime militar, mas naquele tempo eles eram exilados ou deportados. Hoje são expatriados. Ser expatriado é dar um passo no ar, pois não basta conhecer o idioma, as leis e o modo de vida do país destino. Há nuances culturais que podem se transformar em verdadeiras pedras no sapato, expressão que só fará sentido se a população do país não andar descalça ou de chinelos.



Veja, por exemplo, o politicamente incorreto. Passar a mão na cabeça de uma criança na Tailândia é ofensivo, e a menos que você tenha sido fechado no trânsito, nunca faça sinal de positivo com o polegar para cima na Austrália. Na China, não entre sambando se o salão estiver cheio de flores e pessoas vestidas de branco. Não é baile do Havaí. Branco é a cor do luto e deve haver um cadáver ali em algum lugar.

Não são apenas os brasileiros que sofrem no exterior. Um suíço que venha morar no Brasil vai encontrar a anfitriã de roupão e bobs no cabelo, se chegar para o jantar das 19:00 horas exatamente às 19:00 horas. E se participar de uma reunião de trabalho, vai perceber que reunião aqui começa quando todos chegam, e não na hora marcada. E termina quando todos saem.

Isso porque o tempo também possui significados diferentes em diferentes culturas. Os ditados populares deixam isso bem claro. Nos EUA “tempo é dinheiro”, na Espanha “aqueles que correm chegam primeiro à sepultura”, e na Etiópia “se você esperar tempo suficiente, até um ovo é capaz de andar”.

O hábito de dar presentes também difere de um país para outro. No Japão, é melhor não abrir o presente na frente de quem o deu, e nem esperar que o outro abra o que recebeu. Se receber um cartão de visitas no Japão, faça-o com ambas as mãos e fique segurando enquanto o seu interlocutor estiver ali. A regra não se aplica se você estiver dirigindo.

É provável que a maior dificuldade esteja no significado das palavras, algo que ocorre até nas diferentes regiões do Brasil. No interior de São Paulo dizemos que o vidro de um carro está “dando ar”, mas não tem nada a ver com o quebra-vento, e sim com o reflexo do sol que incomoda. Na minha região, qualquer balconista de loja de material elétrico lhe dará um plugue em formato de “T” se você pedir um “benjamim”. Em outras regiões é capaz de sair da loja acompanhado de um rapaz.

Se você for trabalhar em Portugal, é bom atualizar seu vocabulário, ou não vai entender quando ligar para alguém e ouvir: “Estou!”. Se a ligação vier abaixo, não é nenhuma calamidade, e se precisar ir à casa de banho não se esqueça de carregar o autoclismo. Você pode tomar um eléctrico, mas se decidir caminhar é melhor ter um penso no calcanhar. Só não pare na passadeira para ajeitar as peúgas, ou será mais um peão assustado com o travão do camião. Se sobreviver, coma uma sandes com um refrigerante fresco, mas antes peça à rapariga da lanchonete para tirar a cápsula.

Percebeu a dificuldade? Traduções também podem se transformar em armadilhas, principalmente quando palavras de idiomas diferentes forem parecidas. Quando jovem, mudei de casa e cidade tantas vezes que essa minha tendência nômade foi motivo de um comentário feito por um amigo suíço que deixou meu pai indignado. Usando o inglês para fazer a ponte para seu péssimo portunhol, meu amigo simplesmente traduziu do seu jeito a palavra “vagabond” e lascou:

- Seu filho é um vagabundo!

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Expatriação de Executivos - Isabella F. Gouveia De Vasconcelos
O livro Expatriação de Executivos apresenta a pesquisa em expatriação através de grandes correntes de pesquisa. A primeira trata de estratégia empresarial, mostrando como a expatriação pode ser um instrumento para desenvolvimento de competências fundamentais do grupo organizacional. A segunda corrente crítica, associada ao estudo do poder, mostra que os expatriados que melhor sabem negociar e reconstruir suas inserções políticas no país de destino têm sucesso na expatriação. A terceira corrente é ligada a estudos sociológicos e culturais dando ênfase a adaptação do expatriado à cultura do país de destino. Por fim, a quarta corrente trata do modelo transformacional de gestão de pessoas e fala dos processos afetivos ligados à expatriação, associando a pesquisa à análise em psicodinâmica organizacional.

Editora: Cengage Learning
Autor: LENI HIDALGO NUNES & ISABELLA F. GOUVEIA DE VASCONCELOS & JACQUES JAUSSAUD
ISBN: 9788522106103
Origem: Nacional
Ano: 2008
Edição: 1
Número de páginas: 134
Acabamento: Brochura
Formato: Médio


E a gorjeta, doutor?

Um comentário:

  1. Meu prezado Mário Persona, o pior de tudo sobre a cultura é ser massacrado quando se dá sugestão de algo bom, para uma coisa ruim que está arraigada no jeito do povo. Isso que acontece comigo, quando repreendo alguém por ter chegado atrasado a um compromisso com horário. Sempre ouço: " Ah, vá ser chato assim lá na China!" E pior: nem sabem que na China não são tão pontuais assim. Se pelo menos tivesse reclamado me mandando para o país certo, menos mal. Ser chato na China deve ser de morrer. Literalmente.
    Nosso povo não sabe se corrigir, gosta mesmo é de se divertir. Eta Brasil! Tão amado e tão amador.
    Grande abraço amigo.

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