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Eu quero um refil!

Meu último aniversário queimou mais uma espoleta da fita. Você jovem provavelmente não entendeu. É que quando criança eu tinha um revolver de brinquedo para brincar de mocinho, o que hoje você só vê na mão de menores brincando de bandidos. O revólver tinha um rolinho de espoletas, pequenas verrugas de pólvora grudadas numa tirinha de papel. À medida que eu atirava gastava as espoletas e logo precisava de um refil. Esta semana gastei minha espoleta 58. Preciso de um refil!




Quando você é jovem tem saúde para fazer o que quiser, mas não tem dinheiro. Depois, quando tem dinheiro não tem saúde. Por isso tento cuidar da minha, e o suco de abacaxi ajudou-me a perder dez quilos e a sentir-me meia hora mais jovem. Porém nunca pensei que chegaria à fase de estabilidade financeira passando fome. Aposto como você ficou interessadíssimo na receita de meu suco de abacaxi e nem percebeu a palavra "fome", não é mesmo? Tudo bem, anote aí:


  • 1/2 abacaxi
  • 2 limões
  • 1 maçã
  • 1 dedão de gengibre
  • folhas de hortelã
  • bater bem e não coar nem adoçar
  • beber 3 copos nas refeições
  • comer metade do que costuma comer


"Dedão de gengibre" é medida de homem. Se você for mulher, use dois dedões para medir ou empreste o de seu marido. O último ingrediente é o mais importante, mas você não vai nem ligar para ele pensando que o abacaxi faz milagres. É provável que faça como as duas velhinhas do restaurante macrobiótico que frequentei quando jovem. Avisadas pelo guru local que para emagrecer deviam comer arroz e pão integrais, feijão azuki, açúcar mascavo, soja, bardana, raiz de lótus, tofu etc., elas só engordaram ainda mais, acrescentando tudo isso ao que já comiam.

É preciso esforço para perder peso na velhice, você não precisa fazer nada para perder a audição. Ela vem de graça, meio bênção, meio maldição. Bênção porque você passa a ouvir aquela rádio cheia de estática como se fosse alta fidelidade. Maldição porque já não pode ouvir a voz de sua amada, o que alguns também consideram uma bênção.

Enquanto seus cabelos são revigorados e começam a crescer nos orifícios, mas nunca onde deveriam, sua audição não só diminui, talvez por causa dos cabelos, mas também fica estranha. Ruídos que passavam despercebidos agora irritam, e conversar em uma sala com eco equivale a uma sessão de tortura chinesa. Uma por causa do baralhamento das vozes que chegam todas no mesmo volume; outra porque o seu interlocutor parecerá chinês mesmo: você não entenderá bulhufas.

Aquele som cristalino das conversas até ao telefone vira uma coisa pastosa e indecifrável. Ontem uma repórter do Globo News ligou querendo me entrevistar e gastou um bocado de interurbano até eu entender que seu nome não era "Carla", mas "Clara". Com a TV já ocorre um fenômeno interessante: você amplia sua rede social, partilhando seu som com os vizinhos. Para evitar isso procuro sempre filmes legendados, mesmo que sejam no mesmo idioma da voz.

Enquanto alguns sons da cidade somem, outros invadem sua privacidade. Nem preciso falar dos carros que passam tocando nas alturas e nem estão vendendo pamonhas. Veja o caso do sino da igreja que fica a cinco quadras de meu apartamento. Dependendo do vento, o carrilhão que toca às seis da manhã costumava me acordar. Resolvi o problema acordando antes, mas o sino continua a acordar meu filho, que é deficiente físico e mental, para lembrá-lo de fazer um xixi acima da capacidade da fralda. Aposto como o padre nunca precisou trocar lençóis.

O último som a me alfinetar tem sido o alarme da porta da garagem do prédio em frente. Ao invés de instalarem o sinalizador sonoro e luminoso na beira da calçada, como seria o normal, instalaram sobre a porta da garagem que fica no fundo de uma rampa que aponta para a janela de meu escritório como um megafone gigante. Para meu ouvido já confuso aquilo tem o efeito de um alarme de carro disparando a cada carro que entra ou sai. Com direito a meia hora de tortura quando a faxineira lava a rampa com a porta da garagem aberta.

Enfim, se você achava que o nome "melhor idade" tivesse sido dado para significar isso mesmo, está enganado. É melhor porque acaba logo, como a memória. Não falei da memória? Então esqueci. Mas estou me precavendo tomando magnésio todos os dias, que na Web dizem servir para curar tudo, de unha encravada a caspa. Outro dia eu estava a ponto de postar no Facebook de como o magnésio me deixa alerta, focado e com boa memória, quando minha empregada gritou da cozinha: "Seu Mario, o que o vidro de Toddy está fazendo no micro-ondas?"

Mario Persona é palestrante de comunicação, marketing e desenvolvimento profissional. Seus serviços, livros, textos e entrevistas podem ser encontrados em www.mariopersona.com.br

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4 comentários:

  1. Mario, a cada dia você surpreende mais!

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  2. Mario querido!!!quanto tempo não leio seus artigos, rsss e quando venho aqui me surpreendo com o assunto, parabéns.
    Deixo um abraço fraterno e um fim de semana harmonioso.
    Te espero no Perseverança, que faz tempo que você não aparece por lá.
    Nicinha

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  3. Extra!!! "Que o Amour de Deus te envolva de todas partes"

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  4. Anônimo22/3/13

    sabe, eu tb tenho que assistir o filme dublado e legendado senão deixo passar muita coisa, é irritante, se deixo muito alto os vizinhos são obrigados a ouvir junto. Eu tb tomo cloreto de magnésio, mas num sabia que era bom pra memória, eu tomo pras juntas, afinal já fiz 51,a gente só tem garantia até os 30, depois fica com tudo que tem direito. Falando em memória estou naquela fase, vou fazer algo na cozinha por exemplo, paro e me pergunto, o que vim fazer aqui mesmo hihi. Fico consolada em saber que alguém partilha comigo os mesmos problemas.
    DEUS nos abençoe.
    Com carinho
    Flávia

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