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Quando a marola bate no queixo

Quando aquele homem entrou em meu escritório de arquitetura, levantei da cadeira num salto. A princípio pensei que era um empresário que vinha encomendar o projeto que tiraria meu pé da lama.


Senti-me pequeno, diante daquele homem de cabelos pretos esticados com brilhantina, costeleta aparada a bisturi, e vestido num terno que não vinha da mesma liquidação onde eu comprara o meu. Tudo aquilo, e mais a gravata vermelha, o olhar penetrante e o aperto de mão confiante, me deram a certeza de estar diante de um grande empresário. Mas era um vendedor chileno.

Num portunhol elegante, ele começou a falar da crise e da necessidade de eu me preparar profissionalmente, fazendo-me sentir cada vez mais verme por estar ainda rastejando profissionalmente. De vez em quando seu olhar arrastava o meu para uma misteriosa pasta que pendia de sua mão esquerda. Aquele homem me visitou ainda mais uma ou duas vezes, até se convencer de que eu não podia comprar o que ele tinha para vender.

Recém casado, com dois filhos recém nascidos e um escritório recém aberto, eu tentava lidar com as contas recém vencidas. Em 1983 estava assim de arquiteto sem perspectiva e ponto de fuga, só vendendo o almoço para comprar a janta. Nos tempos do "over-night", a aplicação que tentava neutralizar os efeitos da inflação, ninguém queria deixar o dinheiro ao relento da construção civil.

Nem os militares, que já começavam a fazer as malas, enquanto o programa "Amaral Netto - O Repórter" saía do ar. Deixávamos de assistir às cenas do crescimento da Transamazônica para sentir na pele o crescimento da inflação. Até mágico que fazia dinheiro sumir perdeu o emprego. Qualquer brasileiro sabia fazer igual.

Além de mágico e arquiteto, minha carreira incluía vender portas e janelas, aquecedores solares e panelas inox. Nas horas vagas eu vendia meu violão de doze cordas, os anéis e pulseiras da esposa e velhas obturações esquecidas na gaveta. Os óculos com armação de ouro, herdados de meu pai, escaparam junto com a máquina de escrever, pois eu ainda tinha classificados de emprego para ler e currículos para preparar.

É, meu caro, quando a marola bate no queixo a gente engole o orgulho, engaveta o diploma e vira pau pra toda obra. Uns viram palestrantes, outros constroem pousadas no Nordeste e há ainda quem viaje para tentar a sorte no exterior. Mas, na situação atual ouvi dizer que tá assim de americano tentando a sorte em Governador Valadares.

Em meu currículo da época, além de arquiteto, eu incluía as atividades paralelas que, apesar de insuficientes para o leite das crianças, me livravam do estigma de desempregado. Dizer que está parado é dar a si mesmo um atestado de imobilidade e falta de espírito empreendedor.

Depois de desistir de vez de vender o que tinha na maleta, o visitante decidiu contar sua história de empresário no exílio. Perdeu tudo e saiu do Chile com a roupa do corpo, aparentemente um terno italiano. A experiência, a habilidade e a disposição vieram escondidos de Pinochet no cérebro que trazia sob o cabelo engomado.

Tirando sua bagagem, no mais éramos iguais e estávamos no mesmo barco, apenas vítimas de diferentes crises. Para ele, vender de porta em porta não era um declínio em sua carreira, mas uma adaptação circunstancial de quem está prestes a retomar o rumo. Para mim, em início de carreira, a experiência do chileno servia de aprendizado. Finalmente ele abriu a maleta. Encaixadas em nichos de veludo vermelho, vi uma dúzia de fitas cassete de um curso de leitura dinâmica que meu orçamento não permitia tocar.

Dos dois cursos que o chileno me ofereceu, peguei o grátis, o curso de sobrevivência na crise. Aquele chileno era alguém que eu precisava imitar. Ele tinha trilhado todo o caminho, de empresário a vendedor no exílio, mas não se considerava no fim da picada. Aquela atividade era apenas o ponto de partida de seu caminho de volta.

Tão sedutor foi o seu discurso que no dia seguinte eu estava na biblioteca municipal retirando um livro que ensinava leitura dinâmica. No caminho de volta, apertei o cinto até o último furo e comprei uma maleta e um tubo de brilhantina.

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Carreira: que rumo seguir? - Gutemberg B. de Macêdo
Descrição: Como fazer para se destacar e construir uma carreira vitoriosa num universo cada dia mais competitivo? Quais os erros inconscientes que as pessoas cometem e que jogam por terra qualquer chance de sucesso profissional?

Se você vem buscando respostas para essas perguntas, então este livro foi feito sob medida para você. "Carreira: que rumo seguir?", de Gutemberg B. de Macêdo, revela quais os fatores que realmente determinam se uma pessoa será bem-sucedida profissionalmente ou se desempenhará apenas um papel de coadjuvante, servindo de "escada" para o sucesso dos outros. Macêdo, um dos principais consultores de carreira do Brasil, mostra, entre outras coisas, por que pessoas talentosas nem sempre alcançam a projeção que merecem e outras não tão capacitadas conquistam importantes posições de liderança em grandes organizações. Para Macêdo, o que faz a diferença é uma carreira bem planejada e que permite ao profissional trabalhar naquilo que realmente gosta. Só assim ele encontrará no trabalho a sua verdadeira realização.

Editora: Gente
Autor: GUTEMBERG B.DE MACEDO
ISBN: 8573124679
Origem: Nacional
Ano: 2005
Edição: 1
Número de páginas: 168
Acabamento: Brochura
Formato: Médio



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E a gorjeta, doutor?

4 comentários:

  1. Olá! passando para matar as saudades e deixar aquele abraço.
    Nicinha

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  2. Anônimo26/11/11

    bom dia, gostaria de saber o resto da historia, apos a compra da brilhantina
    cristianesautier@hotmail.com

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  3. Após o tubo de brilhantina se tornou cristão praticante foi isso?
    Parabéns pelo evangelho em 3 minutos...

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  4. Rose Gutierrez3/12/11

    Parabéns pelo evangelho em 3 minutos,tem feito parte das minhas manhãs.
    roseartgutierrez@hotmail.com

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