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Parem as maquinas!

Quando eu era criança, se alguém me perguntasse qual seria o futuro do jornal eu saberia responder: o açougue. É que na época eu achava que jornal eram aquelas folhas enormes que entravam em nossa casa de duas maneiras: para meu pai ler ou embrulhando a carne.


Hoje sei que jornal não é a plataforma que ora transporta as letras, ora a carne. Ainda que o jornal de papel desapareça, o papel do jornal não vai desaparecer, pois o jornal é o blog da História. É nele que dona História registra diariamente aquilo que depois será estudado na academia.

Há alguns anos um grande jornal pediu uma proposta para uma palestra. Os diretores queriam conhecer minha opinião sobre o impacto das novas tecnologias em seu negócio. Enviei a eles uma proposta contendo os tópicos abaixo, que podem servir de axiomas para o futuro do jornal impresso. Fique você ciente de que escrevi mais nas entrelinhas do que nas linhas.

  • NEGÓCIOS - O negócio do jornal não é imprimir papel, mas causar impressões com sua investigação, análise e interpretação dos fatos.
  • VEÍCULOS - O fabricante do Cadillac não conseguia entender a razão da queda nas vendas, até perceber que os donos de Cadillac estavam morrendo.
  • HORÓSCOPO - As expressões "the future of the radio", "the future of the television" e "the future of the newspaper" apareceram, respectivamente, 30 mil, 90 mil e 990 mil vezes quando fiz uma busca no Google. Quando tem muita gente olhando para o telhado é porque sua gata deve ter subido lá.
  • POLÍCIA - É difícil competir com a lesão ao vivo e em cores dos meios multimídia. Finalmente o jornal conseguiu se livrar do estigma da máxima que diz que "se não sangrar, não tem audiência". Pior para ele.
  • TEEN - A geração atual aprendeu a ler no videogame, mas quando a pesquisa pergunta ao jovem se ele lê jornal de papel ele diz que sim com pinta de intelectual. Pesquisados são mentirosos e pesquisas são ingênuas.
  • ECONOMIA - A verba de propaganda foi tão pulverizada que agora a briga por ela é entre o conglomerado com 10 mil funcionários e o blog do Zezinho, aquele seu sobrinho.
  • ESPORTES - O consumo de banda e computação móvel cresce. É covardia deixar seus caracteres de tinta correrem na mesma raia dos pixels multimídia.
  • CLASSIFICADOS - Os classificados foram desclassificados e reclassificados pelo Google e pelo MercadoLivre. O balcão de anúncios também pode ser encontrado à venda lá.
  • TURISMO - Insistir que a informação continue limitada ao papel é obrigar os aviões a viajarem em trilhos. Questão de bom senso na logística de distribuição.
  • CULTURA - Na era do RSS (Real Simple Syndication) e da remixagem digital, a tecnologia desbanca a autoria individual, quando genérica e sem sal, e cria colchas de retalhos de informação em cores mais vibrantes.
  • OBITUÁRIO - Vale para o jornal impresso o que vale para o rei: "O jornal morreu. Viva o jornal!".
Você deve estar curioso para saber se aquele jornal gostou da proposta. Provavelmente não, porque não me contratou. Às vezes você precisa dizer aquilo que seu cliente quer ouvir, às vezes não. Existe uma tendência perigosa no ser humano de buscar por opiniões que não deem trombada em sua opinião formada.

Perguntado sobre a razão do desinteresse da nova geração em comprar jornais, um especialista que presta serviços para grandes conglomerados respondeu: "Deve ser porque os jovens estão lendo o jornal comprado pelos pais". Ingenuidade ou conveniência?

Não, eu não sei informar se foi esse especialista que o jornal contratou para a palestra.

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O Destino do Jornal - Lourival Sant´anna
Resultado de uma excelente combinação de rigor jornalístico e metodologia acadêmica na análise de um dos fenômenos mais fascinantes da comunicação social. Lourival Sant´Anna registra a situação dos grandes jornais brasileiros num momento histórico para o meio, que sofre uma crise sem precedentes em várias partes do mundo devido à presença da internet.

Do site "Master em Jornalismo": "A obra contribui sobremaneira para o entendimento do cenário por que passam os grandes jornais brasileiros em mais um momento de transição, profundamente afetado com a massificação da internet. Mais do que oferecer uma “crônica da morte anunciada” dos jornais, Lourival procura analisar a questão a partir de três fatos estruturais: a concorrência cada vez mais acirrada do meio digital; a mudança nos hábitos de leitura, o que explica o consumo de informação dos jovens ser bem maior diante da tela do computador; e a inovação tecnológica, que permite uma interatividade a uma velocidade e custo absolutamente impossíveis no impresso." Continua aqui

Editora: Record
Autor: LOURIVAL SANT´ANNA
ISBN: 9788501081506
Origem: Nacional
Ano: 2008
Edição: 1
Número de páginas: 272
Acabamento: Brochura
Formato: Médio 


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E a gorjeta, doutor?

Um comentário:

  1. Olá Mário,

    O meu ponto de vista está muito alinhado ao seu. Concordo quando aponta a importância da atuação do jornal, ilustra a realidade de mercado e, principalmente, as mudanças de hábitos e cultura de leitura.

    A situação, apesar de estampar um cenário nítido para o futuro, muitas vezes envolve um processo de negação de editores, jornalistas e grupos empresariais proprietários de jornais. É mais fácil finger-se de cego do que assumir a necessidade de enxergar e enfrentar a realidade.

    Apenas para complementar a minha posição sobre o assunto, se permitir, aponto dois textos em que abordo o mesmo tema:

    “Velha mídia, velha” – http://bit.ly/zAJOyt

    “O futuro dos veículos impressos” – http://bit.ly/xGzZo7

    Obrigado e bom trabalho!

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