Na infância, fui escoteiro de uniforme, mas sem chapéu. Os
chapéus do grupo eram fabricados em Limeira pela Prada, a mesma que fabricava
um modelo igual ao do Indiana Jones. Se no filme o chapéu de Harrison Ford não
saía da cabeça, comigo acontecia o contrário. O chapéu não entrava. Eu era um
menino de cabeça grande, desses que a mãe usa o bonezinho para trazer a
melancia da feira. Eu era diferente, e não podia ter um chapéu de feltro como
os outros meninos. Não fabricavam o meu número.
Se na época eu conhecesse um pouco de marketing, saberia que
ser diferente é um privilégio. É o que diferencia da concorrência. Os autores
do gênero descobriram isso, pois num universo de quinze mil, trezentos e cinquenta
e seis títulos —o número de livros de marketing que encontrei na Amazon.com —
muitos deles inventaram novos conceitos de marketing. Ou rebatizaram os velhos.
Há livros sobre “marketing direto”, “marketing um-a-um”, “marketing
de guerrilha”, “marketing digital”, “marketing de rede”, “marketing de
relacionamento”, “...de permissão”, “...essencial”, “...experimental”, “...simbiótico”,
“...interativo”, “...viral”, “...de fertilidade”, “...de banco de dados”, “...de
incentivos”, “...de substituição”, “...de nichos ... Pare! Respire um pouco
porque você está ficando azul! Tem até um do contra, o "Marketing Contra
Intuitivo". O livro "Marketing Outrageously" ainda não foi
publicado aqui, mas deve ser traduzido como "Marketing Ultrajante".
Isto se não mudarem o título, como fizeram com "Gonzo Marketing", que
foi lançado aqui como "Marketing Muito Maluco".
O mais vendido na Amazon.com ainda é o clássico dos
clássicos, "Marketing Management", de Philip Kotler. A 14º edição em
inglês custa lá 235 dólares, e em português custa aqui 55 dólares, o que mostra
que o marketing brasileiro ainda sai mais barato, porém chega atrasado. Lá já
tem a 15ª edição por 263 dólares. Aqui não. Mas no mesmo site da Amazon você pode
comprar a 13ª edição usada por 1,99 dólares, o que demonstra que investir em
marketing a longo prazo pode não ser aconselhável. Marketing no Brasil poderia
ser até mais criativo se não nos preocupássemos tanto em copiar o acadêmico de fora.
Aquele, na verdade, tenta tenta recriar o marketing informal e de sobrevivência
que temos aqui. Como o do lavador de carros do Rio, que se livrou da competição
dos "Lava-Rápido" abrindo o seu "Lava-Lento".
Mas Kotler ainda é referência, e em seu livro fala dos
estágios de marketing vividos por uma empresa. Empreendedor, é o marketing
criativo e barato, quando a empresa começa. Depois ela adota o marketing profissionalizado,
que tenta recriar o empreendedor em laboratório. Finalmente, o marketing se
torna burocrático, cheio de gráficos, pesquisas, tabelas, cálculos de retorno
de investimento e outros recursos, aplicados às vezes mais para justificar a
existência de seu departamento. Marketing profissionalizado é o que Kotler
confessa ensinar na maior parte do livro, pois quanto mais criativo e intuitivo
for o marketing, menor sua possibilidade de codificação literária e transmissão
acadêmica, é o que ensina.
Com tanta gente lançando seu próprio marketing, vou lançar o
meu. "Marketing Tutti-Frutti", tipo salada de frutas, com um pouco de
tudo. Vai ficar como chapéu de Carmem Miranda, carregando todos os conceitos de
marketing vistos até aqui, no rebolado, e sem deixar nenhum cair. Meu chapéu é
grande, não se preocupe. Se não quiser chamar de “Marketing Tutti-Frutti”,
chame de "Marketing Cabeça", que fica do mesmo tamanho. É este o
marketing que faço, mas que na essência sempre será identificar, analisar e
atender necessidades, desejos e expectativas das pessoas.
É por isso que carrego no humano. Veja, por exemplo, a
estratégia que adoto em minhas crônicas. Falam de negócios sérios, numa
linguagem tão informal que beira a irreverência, porque é assim que gente fala
com gente. Seria isto “marketing ultrajante”? Sempre estimulei sua cópia e o
reenvio a qualquer um. Uma de minhas crônicas circulou seis meses pela Internet
antes de voltar para mim. Puro “marketing viral”. Também é “marketing de
permissão”, pois só recebe quem assina para receber o que é publicado em meu
blog. E também é “marketing de relacionamento”, porque acaba sendo um canal de
comunicação permanente com clientes e potenciais. Sites, jornais e revistas são
estimulados a publicá-las como colaboração gratuita, numa clara ação de “marketing
de guerrilha”. Até hoje minha marca já invadiu as páginas de mais de duzentos e
cinquenta veículos. Da Flórida ao Japão. Com o advento do vídeo na Web minhas
crônicas se modernizaram chegando com cara, fala e coragem em minha capenga “TV
Barbante” no Youtube.
A variedade de estratégias que levo no chapéu pode não ser
um jeito muito acadêmico ou convencional de se fazer marketing, mas funciona. É
o “marketing alternativo”, o “marketing caipira”, igual à solução que encontrei
também para meu uniforme de escoteiro na falta do tradicional chapéu de feltro
que não entrava na minha cabeça: um humilde chapéu de palha. É claro que minha
bossa-nova era um verdadeiro desacato ao rigor do escotismo inventado por Baden
Powel, não o da bossa-nova, mas o do escotismo. Fazer o quê, se minha mãe não
queria que eu tomasse sol? Mas eu levava vantagem em termos de marketing. Nas
fotos oficiais do grupo reunido sob a bandeira brasileira, eu sou único,
singular, a “avis rara” em um universo de pardais. Sou o garoto do chapéu de
palha. Os outros? Bem, os outros são todos iguais.
Mario Persona é palestrante de comunicação, marketing e desenvolvimento profissional. Seus serviços, livros, textos e entrevistas podem ser encontrados em www.mariopersona.com.br
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