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Qual é a do papel higiênico!?
https://youtu.be/aD9--w8wuz4
Quando o coronavírus deu a largada pessoas em supermercados de alguns países correram se preparar para o pior. Na hora o pensamento era encher a despensa para estarem bem supridas nos dias de carestia que viriam. Mas nessa corrida não eram alimentos ou medicamentos que ocupavam o departamento de pânico nas mentes das pessoas. Era o papel higiênico.
Tirando a questão do medo, que todos sabemos que pode aumentar seu consumo, onde estaria a razão de justamente este produto ser até motivo de brigas em supermercados e matérias nos principais jornais e TV? Acredito que a principal razão seja psicológica. Ninguém vai comer papel higiênico e, apesar da crise que atinge os jornais, ainda é possível encontrar alguns fazendo o seu papel.
Talvez a eleição do papel higiênico ao primeiro lugar na lista de prioridades esteja na forma como é vendido e como compramos. Quando eu era garoto, não existia tanto plástico nas transações comerciais. Na verdade não existia praticamente plástico algum. Embalagens eram de lata, papel ou papelão, e nos casos de doces e rapaduras até madeira e casca de milho eram materiais usados.
As compras eram feitas nos armazéns, daqueles em que você pedia no balcão e o vendedor precisava subir numa escada para pegar a lata de ervilha na prateleira. Ovos eram cuidadosamente colocados numa vasilha ou em cestinhas de arame em formato de galinha, isto se você levasse uma de casa, ou então eram colocados em um saquinho de papel. Quando era uma criança como eu que ia comprar, fatalmente o cardápio naquele dia seria omelete.
Sim, eu era descuidado assim, mas era também um menino obediente. Foi carregando pela casa uma pilha de discos 45 RPM que reduzi a cacos a coleção de óperas italianas de meu pai. Quando ele disse "FILHO! LARGUE ISSO!", eu larguei. Naquele tempo os discos não eram de vinil inquebrável, mas de goma-laca que quebrava como vidro.
O leite era comprado ou entregue pelo leiteiro em garrafas de vidro de boca larga. O pão, só enrolado num papel pardo. Até o óleo de cozinhar, se você optasse por um mais em conta, devia levar seu próprio litro ao armazém onde havia um grande latão com uma bomba manual para encher a garrafa. Os alimentos, em sua maioria, eram vendidos a granel, pacientemente tirados de grandes barris e pesados em sacos de papel. Se você for jovem talvez precise usar de sua imaginação para entender.
Para levar a compra para casa existiam aquelas sacolas de lonita, geralmente listradas, que todo mundo usava. Quando esquecíamos de levar, o armazém podia colocar em sacolas de papel, mesmo porque ninguém fazia compras para o mês inteiro, como é hoje. Tudo era comprado quase que diariamente para o consumo do dia e transportado um saco em cada mão.
O plástico era uma novidade que começava a aparecer só em alguns brinquedos, porque a maioria era de madeira ou metal. Na época o papel higiênico era vendido individualmente, rolo a rolo, cada um embrulhado numa espécie de papel de seda. Folha dupla? Sedoso? Perfumado? Pode esquecer. Lixa simples e com sorte sem cheiro de mofo.
Hoje tudo é diferente, e o plástico está presente em quase todas as embalagens. Mesmo se o produto vier individualmente em uma caixa ou saco de papel, ele irá para o supermercado agrupado em fardos por uma lâmina de plástico. Apesar de embalagens individuais de ervilhas, café ou açúcar serem tiradas dos fardos e colocadas nas gôndolas para venda por unidade, os rolos de papel higiênico não. Eles permanecem juntos em grandes fardos e acabam sendo o maior volume que levamos para casa.
Eu, que costumo fazer minhas compras à pé usando um carrinho de feira, sou obrigado sempre a voltar para casa abraçado a um fardo de rolos de papel higiênico que não cabe no carrinho. Se me envergonho de andar pela rua assim? De maneira nenhuma. Morando em apartamento, onde é impossível cultivar bananeiras e não assino nenhum jornal, é o que uso todos os dias, e ninguém deveria se espantar com isso.
Então quando a possibilidade de crise bate à porta e as pessoas logo pensam em desabastecimento, a corrida é para pegar o produto campeão em volume, pois é o que passa a sensação de estarmos bem abastecidos. Procuramos a embalagem que passe a maior sensação de vaca gorda para um tempo de vacas magras. A alternativa seria comprar saco de ração para cães, que também é volumoso, mas acho que isto ficará para uma segunda fase, quando não encontramos mais alimento para humanos.
Nosso instinto de sobrevivência nos leva sempre a buscar o maior, o mais volumoso, aquilo que dê aos olhos, antes mesmo que ao estômago, uma maior sensação de saciedade. A isso chamamos de valor percebido pelo cliente, e valor é algo enxergado de diversas maneiras. Na maioria das vezes não se aplica aqui a máxima do "menos é mais", porque quando a fome bate nosso instinto de sobrevivência nos avisa que "mais é mais".
Se você estudou arte — e eu estudei quando fiz Arquitetura — deve se lembrar das mulheres voluptuosas das pinturas de Rubens, que viveu quase quinhentos anos atrás. Na época esse volume nas mulheres que hoje chamaríamos de obesas, era sinal de riqueza e status, como ainda é em algumas ilhas do Pacífico, onde as mulheres são o oposto das modelos de Victoria's Secret. Talvez seja porque lá, como em outras épocas da civilização, calorias não eram baratas e mulheres seriam consideradas insanas se insistissem em perdê-las na academia.
Karl Marx falava da “mais valia”, ao referir-se ao valor acrescentado pelo trabalho. Não tão sisudo ou famoso quanto o pai do comunismo, meu pai também tinha sua teoria econômica. Batizou de “mais chocolate” sua versão de "mais valia". À semelhança das grandes teorias econômicas, a sua também explicava o porquê de dois produtos semelhantes, de igual custo de produção e preço, possuírem diferenças na preferência do cliente. Dependendo do público, o volume também podia influenciar na decisão.
Quando não havia bonequinhos Lego para as crianças brincarem, a preferência delas era por bonequinhos de chocolate, com os quais dava até para brincar um pouco antes de derreterem e serem comidos. Numa época em que ainda não tinham inventado a ideologia de gênero, os bonequinhos vinham em dois modelos: menino e menina.
A“Teoria Econômica dos Bonequinhos de Chocolate” inventada por meu pai, cujo nome por razões desconhecidas nunca apareceu nos livros de economia, dizia que os fabricantes de bonequinhos de chocolate deveriam produzir sempre mais menininhos do que menininhas. Isso evitaria problemas de excesso de estoque de menininhas nos bares e confeitarias, pois a demanda era desigual. Uma pesquisa teria revelado a razão da preferência das crianças pelos menininhos: vinha com mais chocolate.
Mario Persona é palestrante de comunicação, marketing e desenvolvimento profissional. Seus serviços, livros, textos e entrevistas podem ser encontrados em www.mariopersona.com.br
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